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ATLETAS: DEFICIÊNCIAS, PROVAS E SUPERAÇÕES

Luiz Carlos Formiga


No Brasil o “Direito ao esquecimento”, é tratado como o direito à privacidade, intimidade e honra assegurada pela Constituição Federal de 1988 em seu art. 5º inciso X e pelo código civil de 2002, por meio de seu art. 21.
Poucos o conhecem, sendo novo nos tribunais. O direito fundamental de ser esquecido vai além da possibilidade de esquecer o que se passou e desemboca na proteção da dignidade humana. Ele visa não permitir que a privacidade da pessoa seja invadida. Isto porque fatos ocorridos no passado podem ser expostos na mídia social, contrariando a vontade daquele que gostaria de vê-lo esquecido, por toda a sociedade.
Hoje vou me socorrer com o “direito ao não esquecimento” daqueles fatos que podem ser úteis em estudos e ainda como “modelos de superação”.
Entre nós, não podemos esquecer o ano de 1960, pois foi no dia 18 de novembro deste ano, que Éder Jofre venceu Eloy Sanchez por nocaute no sexto "round", no Olympic Auditorium, em Los Angeles, e sagrou-se Campeão Mundial de Boxe pela Associação Mundial de Boxe - AMB.
Éder em 26 de março de  2016 completou 80 anos e providências foram tomadas para que não seja esquecido. Desde 2013, o dia 26 de março é considerado o Dia Nacional do Boxe, em lei criada pelo então deputado federal Acelino “Popó” Freitas,
Lembremos as Paralimpíadas. O Comitê Brasileiro informa que a primeira ocorreu em Roma, em 1960. Mas, a história nos remete ainda ao ano de 1888, quando surgiram os clubes esportivos para pessoas surdas em Berlim, na Alemanha. Em 1922, foi fundada a Organização Mundial de Esportes para Surdos (CISS) e se organizou os “Jogos Silenciosos”. Hoje, os atletas surdos praticam junto de pessoas sem deficiência e não possuem modalidades no programa paralímpico.
Com o término da Segunda Guerra Mundial, 1945, muitos combatentes ficaram paraplégicos ou tetraplégicos. O neurocirurgião alemão Ludwig Guttmann  iniciou um trabalho de reabilitação médica e social de veteranos de guerra, por meio de práticas esportivas. O inicio foi no Centro Nacional de Lesionados Medulares de Stoke Mandeville.
A primeira competição para atletas com deficiência aconteceu no dia 29 de julho de 1948. Quatro anos depois, em 1952, atletas holandeses também passaram a competir nas disputas de Stoke Mandeville. Assim, surgiu o movimento internacional, hoje chamado de Movimento Paralímpico.
Recentemente no artigo “Medalha de Ouro” o médium Francisco Cândido Xavier foi lembrado para a medalha da solidariedade, pelo trabalho, realizado com mães da “dor sem nome”. Seus filhos morreram nas batalhas da guerra civil, nas capitais brasileiras.
 Cremos que também não podemos esquecer os poetas da música popular brasileira, que com sensibilidade oferecem letras inteligentes, elevando-se acima de si mesmos na procura da fraternidade. Lembro o autor de “Onde Deus possa me ouvir”.
Sabe o que eu queria agora, meu bem...?
Sair chegar lá fora e encontrar alguém
Que não me dissesse nada Não me perguntasse nada também
Que me oferecesse um colo ou um ombro Onde eu desaguasse todo desengano
Mas a vida anda louca   As pessoas andam tristes Meus amigos são amigos de ninguém.
Sabe o que eu mais quero agora, meu amor?
Morar no interior do meu interior Pra entender porque se agridem Se empurram pro abismo  Se debatem, se combatem sem saber
Meu amor... Deixa eu chorar até cansar  Me leve pra qualquer lugar
Aonde Deus possa me ouvir  Minha dor...   Eu não consigo compreender
Eu quero algo pra beber  Me deixe aqui pode sair. Adeus.
O poeta não encontra explicação racional para as vicissitudes humanas. Mas, mesmo em aparente depressão, reconhece a existência de uma Inteligência Suprema, embora não saiba onde encontrá-la. Outro poeta, J Gonçalves, sofreu da mesma dor.
Por outro lado, a arte de Vander Lee, sua música, cala fundo na alma e  impulsiona campos vibracionais nobres e elevados, fazendo a identificação com seu público no teatro, o que pode ser observado através do vídeo, link acima.
A arte propicia essa integração do espírito consigo, com o outro, com a Inteligência Suprema e com o universo.
Não foi o que aconteceu numa fase da vida de outro poeta, ateu.
J. Gonçalves experimentou o fenômeno psicossocial chamado lepra. Diante da dor física, quase que insuportável, rejeitou convites para orar, feito por sua mulher. Na sua poesia há revolta e dcepção. Era o ano de 1940, ele revoltado com sua cruel sorte na vida, não queria chorar até cansar, nem ir a um lugar onde Deus lhe pudesse ouvir. Em “Voltei”, parece alimentar ideias suicidas: 
“Onde andará um “não sei quê”, um bem, em cuja busca sou judeu errante?
Por onde eu passo, já passou também... e quando chego já partiu há instante...
Não sei se está na vida, ou mais adiante, dentro da morte, nas mansões do além...
Se está no amor... se está na fé, perante os dois altares que esta vida tem.
Mas, se esta vida é um sonho, a morte o nada; o amor um pesadelo;
a fé receio; por que manter-se em luta desvairada?...
No entanto, eu sigo... acovardado, triste...
A procurar em tudo em que não creio, a coisa que me falta e não existe! “
O que lhe faltava? Deus. A cura?
Após a era dos antibióticos e quimioterápicos, Hanseníase tem cura.
J. Gonçalves era hanseniano, mas sentia a segregação imposta pelo fenômeno psicossocial Lepra.
No leprosário, sua mulher tornara-se espírita.
 “O Espiritismo, longe de temer as descobertas da Ciência e o seu positivismo, lhe vai ao encontro e os provoca, por possuir a certeza de que o princípio espiritual, que tem existência própria, em nada pode com elas sofrer.” ( Kardec, A. 1868. A Gênese. Cap. X.Gênese Orgânica. Pág. 203, ítem 30, FEB)
Alguns anos depois, 1943, Jésus Gonçalves se tornou também adepto da Doutrina Espírita. Esta data é a do lançamento do livro “Nosso Lar”, de autoria de André Luiz e psicografia de  Chico Xavier.
Jésus, agora, “sob nova direção”, reescreve a poesia “Voltei”.
“Hosana! Eu já encontrei o grande Bem, em cuja busca fui judeu-errante."
É o facho luminoso que contém a luz que me ilumina a todo instante!
E ele está na vida e mais adiante, dentro da morte, nas mansões do além...
Está no amor... Está na fé... Perante os dois altares que esta vida tem!
Pois, nem a vida é sonho e a morte o nada. O amor é luz; a Fé o santo meio de tornar esta luta compensada!
Por isso eu sigo... nos caminhos meus, a procurar em tudo quanto creio, a coisa que faltava e ... que era Deus!”
 J. Gonçalves demonstra possuir nova visão, encontra um sentido para a vida, mesmo num leprosário e assim sua poesia sofre transformação. Oferece nova contribuição, mobiliza as energias do bem, que são capazes de fazer desabrochar a estética, e ainda modificar a escala de valores éticos. Torna-se liderança espírita neste local e amigo de Chico Xavier, por cartas.
Monteiro, E.C. A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves. P. 78. Terceira edição, nov. 1983. Editora Espírita Correio Fraterno do ABC. S. B. Do Campo, SP; Xavier, F. C. & Gonçalves, J. Flores de Outono. Terceira edição, 1984. LAKE, pág. 63 e 71).
Para que a pessoa viva na plena consciência da existência se faz necessário encontrar um sentido para a vida. O vazio existencial é encontrado no suicídio, no consumo de drogas.
Com o desenvolvimento da inteligência espiritual se descobre que um poder superior é capaz de devolver nossa sanidade e até uma felicidade relativa, como aconteceu com a “leprosa”, espírita, Leda Amaral. 
Leda é forte concorrente de Éder Jofre na disputa da medalha de ouro da candura. Ambos são espíritas.
Espiritismo marcha ao lado do materialismo, no campo da matéria; admite tudo o que o segundo admite; mas, avança para além do ponto onde este último estaciona. ( Kardec, A. 1868. A Gênese. Cap. X.Gênese Orgânica. Pág. 203, ítem 30. FEB).
Perdoem-me por mutilar uma importante reportagem, sobre o nosso campeão. O resumo imperfeito pode ser compensado clicando no link da Veja. Abril.
Na residência particular de Eder Jofre, medalha de ouro da candura, um quarto tão simples quanto bem arrumado,  na casa da filha,  Campo Limpo,  São Paulo, uma folha de papel A4 colada na porta do armário de madeira compensada avisa com letras femininas e carinho:
“Eu, Eder Jofre, moro com a minha filha Andrea, o marido, Oliveira, e os filhos Lanika, Axel, Babi e Sidney. Moro aqui há nove meses. Quem cuida das minhas coisas são os meus filhos Marcel e Andrea. Estou morando aqui desde que minha esposa, Maria Aparecida Jofre (Cidinha), faleceu, em 10 de maio de 2013, foram 52 anos de casamento.
O campeão mundial em duas categorias (galo e pena), reverenciado por especialistas em boxe de todo o mundo aos 78 anos, foi à lona pela primeira vez com a morte repentina da mulher. “Ela era a cabeça e meu pai, o corpo”, resume Andrea Jofre. Funcionaram perfeitamente nessa combinação durante os 52 anos de casamento.
Deprimido, ele foi internado na Santa Casa de São Paulo. Era incapaz de realizar mesmo as sinapses cerebrais básicas.
A tragédia é que o próprio Eder Jofre, aprisionado no porão de um cérebro que decai, não compreende mais as alturas que galgou.
Impressionado com o estado de saúde do ex-pugilista, em rápida deterioração, o médico da Confederação Brasileira de Boxe, Bernardino Santi, indicou ao filho de Eder, Marcel, o nome do neurologista Renato Anghinah, do Hospital das Clínicas de São Paulo, com quem divide um projeto inédito de estudo dos efeitos dos golpes de boxe na saúde dos profissionais. Anghinah, de reputação internacional, é um estudioso da encefalopatia traumática crônica — mal deflagrado depois de concussões repetidas na cabeça e associado ao boxe desde a década de 20. Ele integra o grupo liderado pelo neurologista Ricardo Nitrini, que investiga, no banco de encéfalos da Universidade de São Paulo, o cérebro do zagueiro Bellini, capitão de 1958. Bellini  pode ter sido vítima das cabeçadas na bola e dos choques com os atacantes adversários nas jogadas aéreas.
Os resultados de exames confirmam: os golpes recebidos durante a carreira são responsáveis pelo estado atual de Eder. Não se trata de Alzheimer. “Com todos os elementos estudados, o quadro é compatível com a encefalopatia crônica”.
Ela afeta também atletas de outras modalidades, como o futebol americano e o hóquei no gelo —, a encefalopatia atinge cerca de 20% dos boxeadores.
Apesar dos extraordinários recursos tecnológicos de análise do cérebro por imagem, um diagnóstico mais detalhado da encefalopatia traumática crônica só pode ser dado depois de exames anatomopatológicos, feitos a partir da dissecção do cérebro.
Somente a dissecção permitirá um entendimento 100% certeiro do que há com Eder. Anghinah prescreveu amantadina, cuja função é estimular os receptores de dopamina no cérebro. A alteração já garantiu uma melhora, mas Éder é ainda um espelho quase sem distorções do que a medicina descreve como resultados comportamentais da encefalopatia traumática crônica.
Angelina Zumbano, mãe de Eder, casou-se com o argentino Kid Jofre, pai, treinador e confidente do campeão, com quem ele — que segue a religião espírita — dizia conversar mesmo depois de morto.
É generosa a atitude dos filhos em permitir que o cérebro do pai seja esmiuçado. Exige coragem e desprendimento também saber que do diagnóstico dos médicos poderia vir, como veio, uma inequívoca condenação do boxe pelos riscos que oferece à saúde do cérebro de seus praticantes. Essa realidade tão óbvia sempre foi mascarada no mundo das lutas.
Marcel Jofre se comprometeu a doar o cérebro do pai, quando a hora chegar. Eder pode fornecer o argumento decisivo para a proposta que vem ganhando força, a de que os boxea­dores profissionais passem a lutar com protetor de cabeça, que era obrigatório nas disputas olímpicas, mas também foi abandonado.
A elegância de garça da esgrima está nos leves toques, e não em ver contendores estraçalhados por golpes de espada, florete e sabre. A beleza do boxe não pode residir em produzir danos permanentes à saúde.
O boxe com proteção pode ter a mistura de inocência e força que Nelson Rodrigues viu no fenomenal pugilista brasileiro: “Eder tem, mesmo no ringue, a candura de menino,  que ainda não disse o primeiro palavrão”.
Recebemos uma mensagem do espírito Leda Amaral (*), medalha de ouro do Braille, através da psicografia de José Salomão Mizrahy. Ele nos informou que fora “leprosa”.
Cega e com os dedos insensíveis, foi obrigada a aprender o Braille utilizando a ponta da língua.
A primeira grande máquina impressora da SPLEB tem hoje seu nome, Leda.
Era jovem, bonita, de pais espíritas, quando a doença a assaltou. Rosto, mãos e pés ficaram deformados. A audição tornou-se reduzida. Olhos sem luz, aos 17 anos. Mesmo assim, passou a fazer apelos telefônicos para alívio do sofrimento dos que a ela recorriam. Arranjava alimentos, internações, socorro assistencial, cadeiras de rodas, muletas, empregos, bolsas de estudos, tudo em benefício dos outros.
Ledinha é Medalha de Ouro da Superação, na Paralimpíada Espiritual.


(*) “O Bem de Hansen”, espírito – Leda Amaral (26/10/1985 - 13/02/1922).

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